Caso Contreira: das primeiras pistas à localização do corpo e prisão do enteado

Corpo do tenente foi localizado em meio ao chão batido e matagal. Na foto, policiais civis e militares logo após a localização (Foto: Melissa Costa)

Região – Um crime bárbaro que deixou colegas de farda e a comunidade perplexos. Após quase 24 horas desaparecido, o corpo do tenente do Corpo de Bombeiros, Glaiton da Silva Contreira, 52 anos, foi localizado em meio ao matagal e chão batido no final da rua Travessão Campo Bom, em Sapiranga, na noite de segunda-feira, dia 26.
Não bastasse a brutalidade da morte, degola com uso de estilete, o crime foi cometido pelo enteado, Yago Rudinei da Silva Machado, de 25 anos. A elucidação foi feita de forma quase instantânea pela Polícia Civil e o acusado, que estava na delegacia como testemunha do desaparecimento de Contreira, se tornou acusado e, após interrogatório, réu confesso. Cerca de duas horas antes da localização do corpo de Contreira, Yago ainda tentou comover a comunidade e esconder seu envolvimento pedindo ajuda para localizá-lo.
O trabalho de investigação da equipe do delegado Fernando Branco iniciou com o registro da ocorrência do desaparecimento feito logo após às 17h de segunda e seguiu madrugada adentro na terça-feira com a localização do corpo, prisão do acusado e diligências. “Temos convicção de que foi crime premeditado e atuamos o mais rápido possível”, diz Branco.

Policiais civis junto à ponte onde estilete, vidro do anestésico e celular foram jogados (Foto: Melissa Costa)

Dopou ele até desmaiar

Interrogado pelos policiais, ele admitiu o crime e detalhou todos os passos que culminaram na degola do bombeiro militar em meio ao matagal e chão batido. No domingo à tarde, ele pediu o carro do padrasto emprestado para buscar seu noivo no aeroporto, que chegava do Rio de Janeiro. Ele sabia que o tenente mantinha uma rotina de caminhar e ofereceu carona para deixá-lo no determinado trajeto de rotina. No percurso, Yago saltou em cima do bombeiro com pano encharcado de substância anestésica em direção ao seu rosto. Ficou segurando até ele desmaiar. Yago tinha conhecimento sobre o uso do produto, por ser estudante de enfermagem. Com o tenente desacordado, ele seguiu para o local do crime. Ele arrastou o padrasto para fora do carro e cortou o pescoço pelo menos duas vezes com estilete, procurando cortar a carótida, que é uma veia vascularizada do corpo. Após, Yago deixou o padrasto agonizando e dirigiu até a ponte da rua Presidente Franklin Roosevelt, onde se livrou do celular, vidro da substância e estilete.

Pesquisas no celular mostram que crime foi orquestrado

No momento que o corpo do tenente foi localizado, a esposa e enteado estavam na delegacia. Os agentes pediram autorização para verificar os celulares deles e receberam resposta positiva. Em uma primeira verificação no aparelho de Yago, na linha de pesquisa, se verificou tópicos que mostram que o crime contra o padrasto foi orquestrado por ele. Nas buscas, haviam pesquisas como “quanto tempo de um ferimento a facada é necessário para socorrer uma pessoa”, “quanto tempo o éter fica no organismo para aparecer em exames laboratoriais” e “qual a possibilidade de vender herança de irmãos menores de idade”. Segundo depoimento dos colegas do Corpo de Bombeiros, Contreira estaria indo embora para outra cidade nessa semana e ficou acordado que ele venderia a residência atual e compraria uma outra para a ex-mulher, a qual deixaria no nome do filho pequeno e em usufruto para ela. “O que causou indignação do enteado, pois ele queria parte da herança. Essa foi a grande motivação para um crime dessa proporção”, explica o chefe da investigação, Carlos Medeiros. Outra pesquisa de Yuri que choca é sobre “mulher separada há uma semana que fica viúva”.

Tenente Contreira ao lado de Yago

Pistas, buscas e elucidação

Em um primeiro momento, quando os bombeiros procuraram a Polícia Civil para registrar o sumiço de Contreira, se cogitou a possibilidade de um suicídio. No entanto, em pouco tempo, a hipótese foi perdendo força. A informação repassada pela família era de que Contreira havia saído para caminhar às 15 horas de domingo e, desde então, não era mais localizado e o celular não tinha sinal. Na primeira pesquisa feita pela Civil, por geolocalização, ele estaria na residência até às 19 horas. Essas informações desencontradas começaram a intrigar os policiais. Por volta das 19h, chegou a informação da localização de um corpo no bairro São Luiz, que era do tenente. A primeira vista, o corpo estava no local a menos de 24 horas. Conforme dados levantados, não havia sinal de luta da vítima, ou seja, ela não tinha reagido. Mais alguns detalhes e informações colhidas pelo delegado e agentes direcionaram as suspeitas para o enteado, que em depoimento acabou confessando todo o crime, que já estava sendo planejado há cerca de duas semanas. Yago não morava com a mãe e o padrasto. Ele residia sozinho em um apartamento. E, conforme depoimentos, Contreira deixaria a residência que vivia com a esposa nesta semana. Com isso, ele teria este último final de semana para conseguir cometer o crime, pois o padrasto mudaria, inclusive, de município.
Ainda na noite de segunda-feira, os policiais civis e bombeiros fizeram buscas para tentar localizar o estilete, vidro do material para dopar e celular do tenente no arroio do bairro 7 de Setembro. Yago é estagiário do hospital de Sapiranga e aproveitou o acesso à casa de saúde para furtar o vidro com a substância Por também ser militar reintegrado do exército, ele foi conduzido para a carceragem do Exército em Porto Alegre.

Tenente Contreira (Foto: João Eduardo Arnhold)

Simulou preocupação nas redes sociais

Ao mesmo tempo que o desaparecimento do tenente chegava ao conhecimento da polícia, Yago também tentava simular sua preocupação com o padrasto. Menos de 24 horas depois de dopar e degolar o tenente, ele pediu a ajuda da comunidade para localizá-lo. Exatamente às 16h40, ele postou o texto que pode ser lido na imagem acima. Ele, por mais de uma vez, chama o tenente de pai na postagem. De imediato, amigos, familiares e colegas de farda de Contreira passaram a compartilhar a publicação. Logo após a prisão de Yago, a revolta de todos tomou conta e muitos postaram mensagens de repúdio a ele na publicação.
A mãe de Yago e o irmão, de apenas 8 anos, estavam inconsoláveis com tudo que acontecia. Em poucas horas, a esposa, que estava em processo de divórcio, descobriu a morte do marido e viu o filho ser preso pelo crime. Perto da meia-noite, os dois, sentados lado a lado, choravam de soluçar na Delegacia de Polícia de Sapiranga.

 

“Profissional exemplar, dedicado”

O comandante da 1º Companhia do 2º Batalhão de Bombeiros Militar (BBM), com sede em São Leopoldo, major Deoclides Silva da Rosa, acompanhou de perto todo o registro do desaparecimento e a localização do corpo do colega de farda.
Deoclides era amigo de Contreira e os dois conversaram pela última vez na sexta-feira, dia 23, dois dias antes do crime. “Ele me contou sobre o processo de separação e também dos planos de passar mais tempo com o filho, de oito anos. Contreira era um profissional exemplar, dedicado e apaixonado pelo que fazia. Pelo tempo de serviço, ele já poderia ter entrado para a reserva, mas queria continuar trabalhando, pois amava o que fazia”. A preocupação do major e dos colegas começou na tarde de segunda, quando Contreira não assumiu o plantão, no Corpo de Bombeiros de Montenegro, onde comandava. “Ele deveria ter chegado no quartel à tarde, inclusive tinha uma reunião agendada. Tentamos contato pelo celular e não conseguimos. Então, depois de não ter sucesso na localização dele, procuramos a delegacia”, lembra o major, que esteve no local do crime e lamentou profundamente o ocorrido com o amigo. “É triste demais”.
Contreira também já havia comandando os quarteis de Taquara, Parobé e Sapiranga.