Tristão Monteiro: a rua que já foi caminho do trem e ajuda a contar a história de Taquara

No local em que funcionava a Estação de Taquara, pinturas contam o passado. Foto: Jauri Belmonte

Por Jauri Belmonte

Taquara  – O município do Vale do Paranhana foi emancipado em 17 de abril de 1986. E dentro das várias histórias existentes em Taquara, impossível definir em poucas palavras uma rua como a Tristão Monteiro. Ela é uma das principais vias da cidade, reúne casarões e prédios antigos, e homenageia aquele que ajudou a fundar o município, com um acervo que arquitetônico que testemunhou muita coisa.

Essa arquitetura eclética consegue manter o passado vivo até os dias de hoje, conectando-se ao processo evolutivo da cidade dentro de muitas variantes, que se ampliam e formam um passado bastante sólido nos quesitos histórico, econômico e social da cidade. Ao longo da rua Tristão Monteiro, situam-se edificações centenárias como o Palácio Municipal Coronel Diniz Martins Rangel (de 1908); a Casa Ebling e Fleck (1908); a Casa Vidal (de 1882 e que está em processo de restauração); a Casa Laube (1921), assim como a Praça Marechal Deodoro, que fica na confluência com a rua Dr. Edmundo Saft – antiga Estrada da Serra Velha. Por sinal, essas duas ruas (Tristão Monteiro e Edmundo Saft) formavam um eixo significativo no início do século passado, concentrando bancos, comércios e casas de saúde. 

O período em que se testemunhou o maior desenvolvimento desta rua, foi quando a Tristão Monteiro abrigou, entre os anos de 1903 e 1964, a Estação Férrea. Foi nessa época que o trem cruzava a vida dos moradores de Taquara, transportando passageiros e ligando Novo Hamburgo à região por meio dos trilhos. Tudo isso contribuiu para o desenvolvimento social e econômico da região, ajudando, especialmente, numa perspectiva de transporte de cargas pesadas entre os vales do Sinos e Paranhana. Em 1924, a linha foi estendida até Canela, facilitando o transporte massivo de madeira, por exemplo.

 

Crescimento vem com a linha férrea

Na Rua Tristão Monteiro, a chegada do trem vai ao encontro da necessidade de uma arquitetura imponente, como explica Michele, que é arquiteta e especialista em Diagnóstico e Restauro de Patrimônio Histórico, e acadêmica do curso de História da Faccat. “A chegada da estrada de ferro em Taquara acompanha um momento de pujança econômica da região; a cidade era um expoente na produção de grãos e os trilhos que conectavam as regiões facilitavam o transporte de tudo que era produzido. Tecnologias também chegam com a linha férrea e esse desenvolvimento do período republicano se traduz na necessidade de deixar as casas mais imponentes. As casas foram criando traços de imponência justamente porque se buscava o progresso”. De acordo com Michele, ao longo da Tristão Monteiro há 23 edificações inventariadas pelas Faccat.

Ela explica, ainda, que esses prédios não podem ser tratados de forma individual e, sim, como um compilado que conta a história taquarense. “Essas casas formam um sítio arquitetônico importante que conta a história da nossa cidade. Tudo precisa ser valorizado. Afinal, Taquara ajuda a contar a história de cada uma das outras cidades que se emanciparam dela”.

Depois do fechamento do trecho, nos anos 60, restou apenas a estrutura. Quase seis décadas depois, o prédio que abrigou a estação de trem, abriga um posto de combustíveis. As paredes trazem marcas de um passado distante. Detalhes, por meio de desenhos e escritas, ajudam a contar um pouquinho do passado e das várias vidas que por ali passaram.

 

Uma história rica e de muito valor

Crescimento. Produção. Economia forte. Tudo passou por esta rua. Se nos dias de hoje, o comércio diversificado, a oferta educacional e de outros serviços classificam a cidade como um polo regional, no passado Taquara também teve momentos exponenciais no quesito econômico. Desde o início do seu período de colonização, a economia de Taquara sempre caminhou junto com a agropecuária. A plantação de feijão, por exemplo, foi destaque nos anos 30, tendo as regiões dos distritos de Rio da Ilha e Padilha como grandes produtores. A terra fértil do município também colocou Taquara como um grande produtor de piretro – flor que era utilizada na fabricação de inseticida -, nos anos 40.

“No processo evolutivo, Taquara teve quatro grandes momentos de destaque econômico e que favorece a urbanização. A cidade chegou a ter o título de maior exportadora de feijão e piretro. Na época da 2ª Guerra Mundial, encerram-se as exportações globais, os Estados Unidos param de importar piretro da África e, com isso, Taquara começa a exportar o piretro justamente para o país norte-americano. Então, foi um período de grande crescimento econômico. E em determinado momento, a cidade figura entre os quatro municípios do Brasil com maior arrecadação. E tudo isso vai ao encontro e existência da rua Tristão Monteiro, especialmente com a presença do trem”, explica Michele Biason.

Os setores calçadista e leiteiro também traduzem momentos áureos para a economia taquarense.

Tristão Monteiro: figura indispensável na história de Taquara

Como mencionado acima, e em pesquisas acerca do desenvolvimento da região, ele é uma figura indispensável na história da região. Tristão Monteiro foi o fundador do município de Taquara em um período de muitas incertezas. Contou com a atuação do, então, sócio Jorge Eggers, no ano de 1845, quando adquiriram a sesmaria que na época era denominada Fazenda do Mundo Novo. A área demarcava o que hoje são os territórios de Taquara, Igrejinha e Três Coroas. E foi nesta área que foram alocadas mais de 100 famílias de colonos alemães que careciam de espaço na região de São Leopoldo. Por meio do trabalho, ao longo da história, eles também ajudam a contar a construção da cidade de Taquara e de toda uma região.

“Inicialmente, Tristão se estabeleceu na Casa de Pedra (Igrejinha), nas proximidades do Rio Paranhana – que na época era Rio Santa Maria. E naquela época tudo era tomado pelo mato, e para desenvolver a região foram feitas picadas, especialmente com intuito de criar um acesso ao rio. Às margens do rio, ele chegou até a área de Taquara. Aqui já havia a estrada da Serra Velha, que era uma conexão entre a área de Taquara e Porto Alegre (Norte-Sul), e a criação do que hoje é a Tristão Monteiro estabeleceu uma via terrestre no outro sentido (Leste-Oeste). As primeiras famílias que foram chegando, vieram por meio do rio, e o que era produzido aqui também era transportado para a região de São Leopoldo e Porto Alegre por meio do rio. Então, quando falamos da rua e da história local, tudo está ligado”, cita Michele.

A arquiteta, recentemente, foi responsável por restaurar o Casarão Solar Pina, datado em 1909, e que figura entre as casas mais antigas da cidade de Taquara.