Mudanças na Previdência Social recebem a avaliação de professor de direito da Faccat

O primeiro turno de votação da reforma da Previdência foi concluído na sexta-feira, 12 de julho. Em agosto, deve ocorrer o segundo turno dos debates, e posteriormente, o texto deverá ser encaminhado ao Senado para apreciação e demais trâmites legais até ser, finalmente, aprovado ou reprovado.
Para entender os principais pontos da proposta de reforma, o Repercussão Paranhana conversou com Rafael Köche, professor de Direito Constitucional nas Faculdades Integradas de Taquara (FACCAT). Köche explica que neste texto, foi perdida a oportunidade de incluir militares – que gerariam o principal déficit previdenciário, segundo professor, além de ampliar debate sobre servidores estaduais e municipais. Além disso, o especialista ainda explica que uma emenda à Constituição (caso da reforma) deveria ser deliberada amplamente, porém, a reforma está avançando rapidamente. “Infelizmente, a votação está ocorrendo em velocidade que não permite esse amadurecimento da questão constitucional”, disse.

E a reforma tributária?

Köche observa que uma reforma tributária também deveria ser realizada, pois onera muito o trabalhador e os empresários. “O Governo Federal optou, ainda, por iniciar as Reformas pelo Sistema Previdenciário que, de certa forma, seria politicamente mais antipática, teria maior resistência popular e que supostamente acalmaria o mercado. Particularmente, entendo que o sistema tributário brasileiro penaliza muito mais os empresários, empregadores, trabalhadores, servidores públicos, militares, políticos, professores, donas de casa e desempregados do que o atual modelo de seguridade social. Temos um sistema tributário regressivo, extremamente complexo e com carga tributária mal distribuída. Temos um estoque trilionário de dívidas tributárias praticamente irrecuperável. Mas infelizmente a Reforma Tributária só será pautada depois da Previdenciária”, pondera.

Principais pontos a mudar com nova previdência

Como era

Iniciativa privada
Por contribuição: Homens 35 anos. Mulheres 30 anos
Por pontos: Homens 96 pontos. Mulheres 86 pontos (soma de idade e contribuição)
Por idade: Homens 65 anos. Mulheres 60 anos (contribuição mínima 15 anos – aposentadoria proporcional)

Servidor público
Homens: Idade mínima 60 anos + 35 anos de contribuição + 10 anos no cargo
Mulheres: Idade mínima 55 anos + 30 anos de contribuição + 5 anos no cargo

Como fica
Homens: Idade mínima 65 anos + 20* anos de contribuição (60% do benefício)
Mulheres: Idade mínima 62 anos + 15* anos de contribuição (60% do benefício)

Mesmas regras de aposentadoria para setor público e privado, com exceção do tempo de contribuição mínimo de 25 anos para o setor público

*Tempo mínimo de contribuição. Benefício pago proporcionalmente

Idade mínima e contribuição

Köche explica que com a regra atua, o trabalhador poderia optar por duas formas de aposentadoria. Com a reforma, elas serão unificadas. “Atualmente, os trabalhadores da iniciativa privada podem se aposentar em duas modalidades: por tempo de contribuição (35 anos, para os homens; 30, para as mulheres) ou por idade (65 anos, para os homens; 60, para as mulheres), neste último caso, devem ter contribuído por, no mínimo, 15 anos. No caso dos servidores, a regra atual é idade mínima de 60 anos, para os homens, 55, para as mulheres (com tempo de contribuição de 35 e 30 anos, respectivamente). Com a Reforma, a aposentadoria passa a ser possível somente com idade mínima, e tal regra é idêntica para setor público e privado, ou seja, 65 anos, para os homens, 62, para as mulheres. O tempo de contribuição exigido, nesse caso será de: 20 anos, homem, ou 15 anos, mulher, para trabalhador da iniciativa privada; e 15 anos, para o servidor público, homem e mulher”, explica o especialista.
Quanto a alíquota de contribuição, é possível perceber uma diminuição no valor da contribuição para quem tem menores salários, e um aumento para quem recebe mais, mas em uma escala singela. “Atualmente, os trabalhadores da iniciativa privada pagam 8%, 9% ou 11%, segundo a faixa salarial até o teto do INSS (R$ 5.839,45 atualmente). A Reforma cria quatro faixas progressivas, de 7,5% a 11,68%. Os servidores públicos federais pagam 11% sobre a remuneração total que recebem. Segundo o novo texto, cria-se oito faixas, de 7,5% (para quem ganha até um salário mínimo) a 22% (para quem ganha acima de R$ 39.000,01)”, pontua.

Previdência não deveria
favorecer desigualdade

De acordo com Köche, a desigualdade, principalmente com relação a distribuição de renda no país, é um problema sério a ser debatido nos próximos anos. Conforme explicação do professor, a desigualdade presente no Brasil está entre as maiores do mundo. “A desigualdade, a meu ver, é o problema político mais importante a ser enfrentado nas próximas décadas. O Brasil é um dos dez países mais desiguais do mundo, conforme demonstrei de forma detalhada no livro ‘Direito da Alteridade (LiberArs, 2017)’. Quando se analisa o extrato dos 1% mais ricos, os bilionários brasileiros ficam à frente dos bilionários do Oriente Médio em termos de concentração de renda. Temos índices de concentração de renda maiores que a África subsariana, por exemplo”, destaca o especialista.
Rafael Köche explica que algumas políticas públicas no País ocasionam esta desigualdade. “O País possui uma série de políticas públicas indutoras de concentração de renda, funcionando como um mecanismo “Robin Hood” às avessas, que tira dos pobres para dar aos ricos. Tributamos muito pouco o capital em relação ao trabalho; há verdadeira distorção entre a tributação do capital especulativo e o capital produtivo, no Brasil – o que prejudica empregados e empregadores, da iniciativa pública ou privada”, elenca.
Com base nestes pontos, o professor de Direito da FACCAT acredita que a previdência não deveria ser utilizada como um mecanismo de desigualdade. “Nesse contexto, o sistema previdenciário não deveria ser mais um indutor de concentração de renda e produtor de desigualdades já existentes no Brasil. Quando a Reforma Previdenciária busca equiparar trabalhadores da iniciativa privada a servidores públicos, ela caminha em direção constitucionalmente adequada (ainda que se reconheça verdadeiras distorções na Reforma, penalizando servidores públicos); quando mantém privilégios, não se inclui os militares nessa Reforma, mantendo-se aposentadoria integral e paritária a certas corporações, infelizmente perde-se a oportunidade de se fazer uma Reforma ampla, geral e irrestrita com vistas à igualdade, justiça social e equilíbrio das contas públicas. Sob o argumento de tratar desigualmente os desiguais não se pode justificar privilégios”, finaliza

Dívida pública deveria ser pauta

Conforme Köche, algo que deveria ter sido abordado também pelos parlamentares concomitante à Reforma, é a dívida pública do Brasil, que só aumenta. “Em termos de déficit público, não apareceu o debate relativo à dívida pública brasileira, que representa o maior compromisso financeiro da União. Quase metade do seu orçamento é consumido anualmente pelo pagamento de juros e amortizações da dívida, que cresce anualmente, ainda que se gaste trilhões com seu pagamento”, disse.

Foto e texto: Taylor Abreu