Comentário: Não podemos mais esperar

Por Marcos Rovinski | Vice-presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers)

Passado o período crucial de enfrentamento à Covid-19, ainda que com os sobressaltos da variante Delta, a comunidade médica tem um novo desafio: a volta dos tratamentos eletivos. Os índices epidemiológicos apontam para a diminuição da curva de crescimento da doença, as taxas de ocupação de leitos caminham para a normalidade, e as consultas, exames e cirurgias estão sendo retomados. Mesmo assim, os médicos ainda precisam lidar com o medo dos pacientes.

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima um aumento de 30% nas mortes por câncer no planeta nos próximos dois anos devido ao represamento de consultas, exames e tratamentos — e, principalmente, pelo receio de pacientes em procurar atendimento médico.

Outros números vão na mesma direção. Dados da Sociedade Brasileira de Cardiologia alertam para um acréscimo de 31,8% nas mortes em domicílio em decorrência de AVC, infarto e outras doenças cardiovasculares em 2020, em relação ao ano anterior. Esse índice está possivelmente ligado a fatores como acesso limitado a hospitais, redução da procura por cuidados médicos e o próprio isolamento.

Levantamentos sobre câncer também demonstram preocupação. DATASUS e Oncoguia — ONG de apoio a pacientes oncológicos — revelam queda de cerca de 50% em exames citopatológicos, enquanto mamografias e biópsias diminuíram 39% entre os meses de março de 2020 e de 2021.

O problema é que, a cada ano, cerca de 700 mil brasileiros recebem o diagnóstico de câncer e 225 mil morrem por causa da doença. Em situações normais, o país já possui alta taxa de diagnóstico tardio. Com o medo do coronavírus, a tendência é de que esse quadro se agrave.

Além da conscientização sobre a importância das medidas de prevenção à Covid-19, a classe médica precisa agora se concentrar — com urgência — no retorno dos procedimentos eletivos. Tudo, repito, em harmonia com os cuidados necessários em tempos de pandemia. Receio de contaminação em ambientes de atendimento, atrasos na realização de consultas e exames e abandono dos tratamentos podem custar muitas vidas.

Percorremos um longo caminho até aqui — e não há previsão assertiva que nos assegure quando esse capítulo da humanidade será encerrado. Mas, passo a passo, enfrentaremos os desafios. E nós, médicos, seguiremos com a missão de salvaguardar o bem-estar das pessoas, seja qual for o cenário que se impuser. Agora é hora de retomar o ambiente de confiança, com a consciência de todos de que é essencial cuidar da saúde em sua integralidade.