Catástrofes recorrentes acendem alerta para mudanças de atitudes e cuidados com o clima

Os recorrentes desastres climáticos registrados em diferentes regiões do Estado nos últimos meses acendem o sinal de alerta das autoridades, preocupam a população e aceleram a discussão sobre a necessidade de implantação de medidas que preservem o meio ambiente, a fim de evitar catástrofes ainda mais prejudiciais as nossas comunidades.

Somente entre os meses de junho e setembro, os efeitos dos eventos climáticos severos tiraram a vida de quase 50 pessoas, o que representaria cerca de 1% da população de Campo Bom que tivesse desaparecido com a passagem dos fenômenos naturais.

Os sinais de que o clima está sofrendo alterações recorrentes fica evidenciado também pelas diferentes incidências de fenômenos que atingem a região. Se agora foram as fortes chuvas e temporais, ainda no final de 2022 e início desse ano, secas e incêndios castigaram o Estado, como por exemplo a grande devastação sofrida pela Reserva Ecológica do Taim, em dezembro de 2022.

Especialistas da área ouvidos pelo Repercussão destacam diferentes pontos para as ocorrências contantes. O professor Dr. Carlos Fernando Jung, diretor do Observatório Espacial Heller & Jung e coordenador do Curso de Engenharia de Produção e Professor do Mestrado em Desenvolvimento Regional da Faccat, observa que “quanto as mudanças e fatores climáticos que estão ocorrendo deve-se entender que existe um fenômeno chamado El Niño que está afetando este período. Um problema que está ocorrendo neste inverno é justamente o Impacto nas tempestades tropicais: o El Niño pode afetar a formação e intensidade das tempestades tropicais em diferentes partes do mundo. Em algumas regiões, pode haver um aumento na atividade de ciclones. Isto tem afetado, em especial, nossa região sul”, destaca Jung.

Estudo como forma de contribuir para o avanço de desastres

A população e suas atitudes no dia a dia estão diretamente ligadas aos efeitos das mudanças climáticas. Para o professor Jung, “as pessoas podem afetar o microclima, que refere-se as condições climáticas locais e específicas que existem em uma área pequena e limitada onde residem. Essas condições climáticas locais podem ser influenciadas por uma série de fatores, incluindo topografia, vegetação, altitude, proximidade da água, edifícios urbanos e outras características ambientais”, cita ele. “O estudo dos microclimas é importante em várias áreas, principalmente para a formulação de políticas públicas e para tomar decisões sobre o planejamento de cidades”, sublinha. “Este tipo de estudo e ações correspondentes podem evitar ou reduzir o impacto de fenômenos naturais como o El Niño sobre as cidades, tanto na área urbana, como rural. O crescimento desordenado e sem planejamento torna mais vulnerável a população a diversos fenômenos naturais que sempre ocorreram desde a formação do planeta havia 4,5 bilhões de anos”, acrescenta o especialista.

Municípios da região contam com planos de contingência para evitar danos maiores

Em paralelo a necessidade de mudanças para preservar o clima e evitar consequências severas, as cidades da região aprimoram, cada vez mais, as ações de contingenciamento para socorrer a população em casos graves e evitar que mais famílias sejam prejudicadas.

Em Igrejinha, a abertura do plano de contingenciamento inclui Defesa Civil, Secretaria de Obras, Bombeiros Voluntários, Secretaria de Agricultura e Interior, Secretaria de Assistência Social, Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente, Gabinete, Imprensa e Brigada Militar. “Com a abertura desse plano, todas as equipes e equipamentos ficam a postos para usar no start do evento”, informa a coordenadora da Defesa Civil da cidade, Alessandra Azambuja. “Utilizamos retroescavadeiras, caminhões, pá carregadeira e escavadeira hidráulica. Os funcionários ficam de sobreaviso e os bombeiros ficam com o efetivo de sobreaviso”, acrescenta Alessandra. O plano de contingenciamento de Igrejinha prevê, ainda, abrigo provisório para receber possíveis famílias desabrigadas.

Em Taquara, a prefeitura estruturou o Grupo de Ação Emergencial, que reúne Defesa Civil, Secretaria de Desenvolvimento Social, Diretoria de Trânsito, secretarias de Obras e Saúde, Bombeiros, Conselho Comunitário Pró-Segurança Pública, forças de segurança e voluntários. Sempre que há anúncio de evento atípico, o grupo inicia o protocolo de ação.

Já em Rolante, o plano de contingência conta com mobilização de equipes e recursos para as áreas atingidas, conforme necessário; realização de resgate e salvamento de pessoas; atendimento e abrigo às vítimas, fornecendo assistência médica, alimentação e cuidados básicos; controle e monitoramento das condições climáticas e riscos associados; monitoramento e controle de áreas de risco, como encostas e áreas alagadas; realização de evacuação de áreas de risco, se necessário; coordenação e suporte as equipes de resgate e aos capacitados para ações emergenciais; gestão de suprimentos e materiais necessários para as operações de resposta; comunicação eficiente com a população afetada, entre outras iniciativas. “Essas ações são planejadas e implementadas de acordo com os procedimentos e diretrizes estabelecidos no Plano de Contingência Municipal de Rolante, visando a proteção e segurança da população em situações de emergência”, cita Gustavo Rosa, coordenador da Defesa Civil do município.

Em Sapiranga, a Defesa Civil do município, juntamente do Corpo de Bombeiros, atua no monitoramento dos pontos da cidade próximos de arroios, bem como pontos de risco de deslizamentos de terras.

Controle das ações humanas

Professor e coordenador do Núcleo de Gestão e Educação Ambiental da Faccat, Felipe Leão lembra que o aumento de temperatura no planeta ocasiona, automaticamente, o aumento das chuvas. “As regiões mais úmidas, com esse aumento das chuvas, acabam sofrendo mais e se tornam mais suscetíveis as inundações porque as águas infiltram menos e escoam mais e causam situações como as vivenciadas na última semana”, detalha Felipe. “Participei de um seminário recentemente, onde foi comprovado o aumento de temperatura na superfície do Oceano Pacífico e que aponta a presença do El Niño”, acrescenta. Para o professor da Faccat, é necessário entender que ocorreram mudanças no sistema climático. “A gestão pública precisa entender essa mudança e adaptar os modelos, assim como fazer um estudo da vulnerabilidade, principalmente dessas zonas costeiras e também esses novos modelos climáticos, analisando umidade e emissão de gases”, cita Felipe, que acrescenta, ainda, a necessidade de entender cenários econômicos. “A gente tem um aumento da população e precisamos analisar os meios de transporte, indústrias, afinal tudo isso tem a ver com nosso estilo de vida. Precisamos estudar para ver como podemos evitar esses impactos”, finaliza Leão.

Desassoreamentos também ajudam a evitar desastres

Uma das ações que ajuda a evitar consequências maiores quando da ocorrência de cheias em rios e córregos é o desassoreamento desses cursos fluviais. Em Igrejinha, por exemplo, desde 2013 é mantido de forma permanente o programa de desassoreamento do Rio Paranhana e dos arroios do município, que são licenciados pela Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente e Defesa Civil. Rolante também atua no processo de desassoreamento do Rio Rolante, com equipe da Secretaria de Obras capitaneando esse serviço.
Em Taquara, desde o início da gestão da prefeita Sirlei Silveira, foram realizados desassoreamentos no Rio Paranhana, Arroio Santa Maria, Arroio Sonda e Rio Padilha. Ainda neste ano, será realizado o desassoreamento do Arroio do Pega Fogo.

Sociedade envolvida

Danielle Martins, professora do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale e coordenadora do Laboratório de Vulnerabilidades, Riscos e Sociedade (LaVuRS), ressalta que os problemas de aquecimento global afetam não só o Estado e o Brasil, mas, sim, é um fenômeno a nível mundial. “A gente teve esse ano o mês de julho mais quente, a temperatura mais alta já registrada no planeta e esses são fatores que nos trazem um sinal de alerta para considerarmos a nossa vulnerabilidade como seres humanos, como atividades humanas frente a um planeta que vem tendo seu sistema climático alterado”, alerta Danielle, que também destaca a importância de um envolvimento de toda a sociedade para contribuir e entender maneiras de reduzir esses danos. “É fundamental que toda a sociedade faça parte desse processo de pensar essa problemática. Então, é um momento muito importante de olhar o que já temos como estrutura e dedicarmos atenção no cumprimento da legislação já existente”, sublinha. “A gente precisa de ações coordenadas, mas existem responsabilidades diferentes. Temos a nossa responsabilidade individual como cidadão, mas quando a gente olha para eventos maiores, com desastres e perdas humanas, aqueles que são responsáveis por coordenar mudanças territoriais precisam priorizar essas práticas para que a gente consiga, no futuro, reduzir essas perdas e criar medidas de adaptação. É preciso articular todos os atores da sociedade”, finaliza Danielle.

Ações para contenção de alagamentos

Uma outra alternativa implementada em diferentes municípios para evitar danos com as fortes chuvas é a melhora e substituição das tubulações que escoam as águas das vias urbanas.

Em Taquara, foi feita a troca de mais de 12 quilômetros de tubulações, melhorando o escoamento pluvial e resolvendo os problemas de escoamento das águas da chuva, como na Pinheiro Machado (tanto no Bairro Petrópolis, como no Jardim do Prado). Em breve, o mesmo será feito na rua Bahia, no bairro Santa Teresinha.
Sapiranga também realiza essa ação de troca de canos e, nos locais onde não há a necessidade de substituição, é realizada a limpeza da tubulação. Equipes da Secretaria de Obras Públicas também realizam a implantação de bacias de contenções, além de colocação de novas canalizações.